sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Despertar

Olhava fixamente para as mãos. Suas mãos.
O rosto não guardava qualquer expressão, nem um esboço de tudo que carregava no peito, nem dos pensamentos que, como em desenfreada corrida, ocupavam sua mente.
Aquelas mãos, suas mãos, sempre ocupadas em um afago, um consolo, um cuidado, hoje desnecessárias, esquecidas, como que vazias.
O faz de conta em que se refugiara não lhe dava mais acolhida e o aperto em sua alma não mais permitia que fingisse não perceber a indiferença, o esquecimento, a crueldade do abandono.
Agora a necessidade premente de entender, descobrir, precisar no tempo o momento em que aquelas mãos, suas mãos, deixaram de ser procuradas.
Não, foi mais que isso. Foi o desprezo, a sordidez da falsa e conveniente ignorância, a covardia em não reconhecer todo o bem recebido daquelas mãos.
Consumia-se em pensamentos, com os olhos secos, pois nem as lágrimas, abençoado alívio, mesmo que passageiro, vinham em seu auxílio.
Ainda observando aquelas mãos, suas mãos, teve a certeza de que tudo ainda estava lá para ser ofertado, embora não mais a quem antes de tudo usufruía, a quem nada mais de suas mãos receberia.
E, dando-se conta de que nada perdera, que tudo ainda estava lá, em suas mãos, finalmente chorou
Chorou de tristeza por aqueles que tardiamente lembrariam e de alegria por si e por todos que ainda estavam por vir.
Não, jamais viveria a tristeza de ter as mãos vazias.

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